Depois de complexas negociações políticas e jurídicas nas últimas semanas, os Chefes de Estado e de Governo da União Europeia chegaram ontem a acordo quanto àquele que será conhecido por Tratado de Lisboa.
O documento será assinado a 13 de Dezembro, no Mosteiro dos Jerónimos.
Depois, cada um dos Estados-Membros terá de proceder à ratificação do Tratado, o que será feito de acordo com as respectivas regras internas.
No caso português, a ratificação poderá suceder através de mera aprovação pela Assembleia da República ou por referendo popular.
Pela minha parte, parece-me que a solução mais avisada será a da ratificação parlamentar.
O instituto do referendo em Portugal não é um caso de sucesso. Mercê da falta de interesse dos assuntos submetidos a referendo (regionalização e aborto) ou da elevada complexidade das perguntas referendárias, a verdade é que nenhuma das três consultas referendárias mereceu por parte dos portugueses uma significativa participação eleitoral, pelo que nunca se atingiram os “mínimos obrigatórios”. Assim, nenhum dos referendos realizados foi vinculativo.
E a possibilidade de tal situação se repetir não é uma mera especulação, é – isso sim – uma grande probabilidade.
Duvido que mais de 50% dos cidadãos eleitores estejam disponíveis para sair de casa com o objectivo de votar num referendo sobre um Tratado que, pura e simplesmente, não conhecem nem compreendem.
E como podem compreender quando, e dou apenas um exemplo, o artigo 5.º do futuro Tratado de Lisboa tem esta redacção:
"Artigo 5.º
1. A delimitação das competências da União rege-se pelo princípio da atribuição. O exercício das competências da União rege-se pelos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade.
2. Em virtude do princípio da atribuição, a União actua unicamente dentro dos limites das competências que os Estados-Membros lhe tenham atribuído nos Tratados para alcançar os objectivos fixados por estes últimos. As competências que não sejam atribuídas à União nos Tratados pertencem aos Estados-Membros.
3. Em virtude do princípio da subsidiariedade, nos domínios que não sejam da sua competência exclusiva, a União intervém apenas se e na medida em que os objectivos da acção considerada não possam ser suficientemente alcançados pelos Estados-Membros, tanto ao nível central como ao nível regional e local, podendo contudo, devido às dimensões ou aos efeitos da acção considerada, ser mais bem alcançados ao nível da União.
As instituições da União aplicam o princípio da subsidiariedade em conformidade com o Protocolo relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade. Os Parlamentos nacionais velam pela observância deste princípio de acordo com o processo previsto no referido Protocolo.
4. Em virtude do princípio da proporcionalidade, o conteúdo e a forma da acção da União não devem exceder o necessário para alcançar os objectivos dos Tratados.
As instituições da União aplicam o princípio da proporcionalidade em conformidade com o Protocolo relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade."
Sujeitar a ratificação do Tratado a referendo popular pode ser uma “boa tirada” demagógica, mas não é concerteza uma atitude responsável, pois Portugal corre o sério risco de chumbar o Tratado que terá o nome da sua Capital apenas porque mais de 50% dos cidadãos eleitores ficaram em casa no dia do referendo…